Saiba como criar um ambiente emocionalmente satisfatório para seus gatos e evitar conflitos entre eles
Ter mais de um gato em casa é uma delícia, mas pode se tornar um desafio quando um deles busca o tempo todo “dominar” os recursos disponíveis no ambiente. Embora o termo “gato dominante” seja bastante usado pelo público leigo, na medicina felina não se usa, segundo a médica-veterinária Debora Paulino, da Mais Gato, de São Paulo. “A gente diz que os gatos têm preferência por alguns recursos”, esclarece. E os recursos podem ser desde o pote de água, de comida, um brinquedo, um lugar de descanso, até uma pessoa. Mas a profissional explica que um gato pode preferir dormir no alto do arranhador, por exemplo, mas não querer todos os lugares altos da casa. “E ele pode ser o gato que tem a preferência pelo alto do arranhador e também por ser o primeiro a começar a cheirar quando o tutor oferece algo, ou o primeiro que vai comer a comida que está fresca. Então, ele pode ter pontos de preferência.”
AGRESSIVIDADE OU DEFESA?
De acordo com Debora, não se pode afirmar que todos os gatos que são tidos como dominantes sejam necessariamente mais agressivos. O que acontece é que eles podem se mostrar defensivos, com alterações na postura corporal e na expressão facial, quando outro gato invade seu espaço ou utiliza seu recurso preferido, e isso, é claro, pode gerar momentos de tensão entre os felinos. Mas o fato é que o gato pode defender sua cama favorita, mas ser indiferente à comida, permitindo que outros gatos se aproximem sem iniciar nenhum conflito. O comportamento agressivo e hostil é, na maioria das vezes, uma forma de comunicação frente à tentativa de proteger algo que ele considera seu, além de ser uma demonstração de insegurança, pois ele sente que seu território está sendo invadido.
MUDANÇAS NO AMBIENTE
Quando os gatos de uma mesma casa começam a brigar, é essencial promover o enriquecimento ambiental, garantindo que todos tenham espaços suficientes e recursos adequados. “A gente usa o termo enriquecimento ambiental, mas o mais apropriado seria reestruturar esse ambiente a fim de atender às necessidades da espécie felina e dos indivíduos que ali vivem. Então, conhecer essas individualidades, essas preferências, e conseguir estruturar um ambiente que atenda a elas”, descreve Debora. Deve-se redistribuir itens como potes de água, comida, caixas de areia, arranhadores e brinquedos nos diferentes pontos da casa, de modo que todos os pets tenham acesso aos recursos sem se encontrarem o tempo todo. Outro ponto importante é que os locais de descanso devem proporcionar segurança ao gato, para que ele não sinta necessidade de manter um estado de vigília, nem essa proteção exacerbada.
ROTINA E INTERAÇÃO
Os gatos precisam de previsibilidade. “Isso diminui a ansiedade”, afirma Debora. Para ela, é preciso estabelecer uma rotina de interação entre o dono e o pet, com brincadeiras diárias de pelo menos 10 minutos ou, no caso de gatos que não gostam de brincar, interagir com carinho ou escovação. Interagir com os gatos deve ser parte da rotina. É tão importante quanto a higiene e o cuidado com a casa, e o tutor deve entender que um comportamento de preferência, entendido muitas vezes como dominância, não significa que ele é um gato mau, um vilão. “Ele está fazendo isso, na verdade, pelo contrário, porque ele é uma vítima dessa situação, do emocional dele”, diz Debora. Ainda segundo ela, é importante conseguir olhar para esse gato de uma forma gentil, buscando uma solução.
TERAPIA MULTIMODAL
Quando a reorganização do ambiente e da rotina não são suficientes para garantir a paz numa casa com mais de um gato, pode ser necessário entrar com outros recursos, sob a indicação do médico-veterinário. “Em alguns casos, a gente utiliza feromonioterapia, musicoterapia ou até medicamentos controlados”, conta Debora. “Nós podemos utilizar também nutracêuticos para esses gatinhos, para ajudar a equilibrar essa questão emocional. Essas outras terapias são adicionadas à medida que a família vai necessitando.”
PROBLEMA PERSISTENTE
Debora explica que há casos em que infelizmente a melhor escolha emocional para o gato é que ele seja filho único. “Mas dependendo quanto essa casa foi gatificada, da relação entre esses gatos, se é uma relação que já está há muito tempo desgastada, se esses gatos têm que se encontrar a todo momento, se o espaço é pequeno etc.” A profissional ressalta que esse comportamento conhecido como dominância não deve ser inibido pelo tutor. “Ele não vai saber a hora certa de fazer isso, de impedir um comportamento, e provavelmente vai acabar punindo esse gato, dando bronca, usando um spray, afastando um gato do outro, depois que a situação já tiver acontecido. E muitas vezes o gato não vai conseguir compreender porque o tutor está tendo aquela atitude. Não devemos intervir porque temos mais chances de intervir no momento errado e intensificar essa situação de hostilidade entre essa família de gatinhos”, diz a médica-veterinária. Ela recomenda, nessas situações, que o tutor busque ajuda profissional de um comportamentalista, “pois ele vai conseguir trazer para esse tutor a perspectiva ambiental a partir da visão do gato, uma perspectiva felina traduzida em palavras, para que o tutor enxergue esse ambiente de uma outra forma”, finaliza.
Nossos agradecimentos:
Debora Paulino Médica-veterinária; pós-graduada em Medicina Felina; com Certificação Internacional pela ISFM em Advanced Feline Behaviour, pela AAFP em Cat Friendly Veterinarian, e pelo programa Fear Free Shelter; professora e coordenadora de pós-graduação em Medicina Felina; mentora e professora no Gefel Anclivepa; diretora do Coletivo Afrovet e do Comitê DEI; fundadora e Mente criativa na Mais Gato – Cuidados Catfriendly; e membro da ISFM e ABMLuto.
Instagram: @vetdebeepaulino @maisgato
Por Lila de Oliveira