Por que gatos são tão curiosos?

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É preciso atenção, pois são diversas causas que podem levar ao transtorno, e os sintomas bem são variados 

Se você tem um bichano em casa, entende bem a expressão “a curiosidade matou o gato”. Isso porque eles se interessam por tudo que está acontecendo ao redor deles, desde a sacola com compras do supermercado até o barulho causado por um objeto derrubado. Eles vão querer investigar. E quem explica esse comportamento é a sua própria natureza. “O gato é curioso, pois é um animal inteligente, como também são os cachorros, os primatas e os golfinhos. Mas ele tem maneiras bem perceptíveis e reconhecíveis aos nossos olhos de demonstrar essa curiosidade”, descreve Carlos C. Alberts, professor e pesquisador do Laboratório de Evolução e Etologia (LEvEtho), da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Assim como nós, os gatos utilizam muitos sentidos para perceber o mundo ao seu redor. Carlos explica que facilmente detectamos a curiosidade felina graças a sua postura e movimentação, que é muito similar à postura humana quando prestamos atenção em algo. “Nós temos uma identificação direta com o comportamento do gato. Se o gato perceber um barulho ou movimento diferente, ele vai lá olhar. Parece muito uma criança curiosa. Quando algo chama sua atenção, ele fica com o pescoço direcionado e esticado na direção do objeto, parado, com foco total, principalmente utilizando a audição e a visão.”

Característica natural

 O que determina a inteligência de um animal são suas grandes capacidades cognitivas, a boa memória e o fato de ser capaz de aprender com os erros. É uma característica evolutiva. Os animais mais inteligentes tiveram vantagens em relação aos menos inteligentes. “Um animal inteligente compreende o seu mundo e tenta antever o que vai acontecer. E, para isso, ele explora tudo que é possível. Assim, ele descobre onde estão recursos, presas, ameaças e inimigos”, conta Carlos. 

De acordo com o médico-veterinário Waldir Fonseca, de São Paulo, no ambiente selvagem, gatos são caçadores solitários e, portanto, sempre estão disputando território e alimento. “Eles percebem o mundo por meio dos seus sentidos e do uso de meios vocais, visuais, olfativos e táteis para se comunicarem. Entender esse sistema de comunicação é fundamental. A comunicação clara ajuda-os a evitar lesões e possíveis ameaças. O uso estratégico de sentidos faz com que os gatos possam proteger o seu espaço se precisarem encontrar outros gatos ou interagir fisicamente com eles”, explica Waldir. 

Como felinos são exclusivamente carnívoros e, portanto, predadores, quando acabam as presas de um território, eles precisam buscar um novo local. Muitas vezes esse novo local oferece riscos e pode até mesmo ser território de outro felino, que vai disputar o espaço. Assim, eles precisam estar muito cientes do território ao redor, pois disso depende a sua sobrevivência.

 Apesar dos anos de domesticação, os gatos ainda trazem muitas das características selvagens para dentro das nossas casas, inclusive a necessidade de entender tudo dentro do seu território entre quatro paredes. Uma simples troca de móveis é suficiente para deixar o gato interessado e desconfiado. Carlos explica: “outros animais também têm comportamentos curiosos quando chegam a um lugar novo, mas passa com o tempo, após explorarem o local. O gato não. Ele pode viver 20 anos no mesmo lugar e vai continuar sendo curioso, porque qualquer mudança dentro do seu território é muito significativa para ele”. Diante de uma novidade no território, o gato precisa entender o que foi alterado, por que ocorreu a mudança, onde ele deve se posicionar e o que precisa fazer. Ele precisa saber de tudo. 

A curiosidade nata felina não significa que a exploração é executada sem cuidados. Mesmo os grandes predadores felinos na natureza, como os temíveis leões e tigres, investigam o território com cautela. Por isso é possível observar o interesse do gato mesmo diante de situações e objetos que lhe causam receio, como o aspirador de pó ou a máquina de lavar. “Definimos o medo como uma resposta emocional que capacita um animal a evitar situações e atividades potencialmente perigosas, e isso ocorre comumente em gatos em ambientes não familiares a eles”, argumenta Waldir. 

Novidade positiva

 Não é porque a novidade dentro de casa pode causar receio no gatinho que ela não deve ser inserida. Carlos garante que os tutores de felinos não precisam se preocupar em impedir qualquer situação ou objeto que vá causar um estranhamento inicial no bichano. Dificilmente isso geraria algum trauma nos pets. “Já ouvi muitos relatos de pessoas afirmando que os seus gatos gostam muito das empregadas domésticas que vão à casa esporadicamente. Elas são uma novidade, mas frequente, alguém com quem estão acostumados. Elas mexem em toda a casa, mudam as coisas de lugar, ligam a máquina de lavar, usam a vassoura. É uma festa para os gatos”, exemplifica. 

Os estímulos visuais, sonoros e olfativos de um dia de faxina na casa podem instigar bastante a curiosidade do pet. Quanto mais contato, mais o pet fica confiante e relaxado diante das situações diferentes e incomuns no seu território. E estas são as reações que os tutores devem buscar nos pets para que eles se desenvolvam felizes e saudáveis.

Estimulando a curiosidade

 Diferentemente dos cachorros, que têm dentro da rotina passeios fora de casa, os gatos costumam ficar somente dentro do ambiente doméstico. Aqui na revista Pulo do Gato, já entrevistamos diversos especialistas felinos que explicam a importância de manter os bichanos sem acesso à rua, para sua segurança, saúde e bem-estar. Mas, se o dia a dia dentro de casa favorece a rotina, que também é importante para os gatos, também possibilita o tédio. “Na minha opinião, surpresas e novidades são benéficas. Como qualquer animal inteligente, os gatos podem se entediar se não tiverem contato com coisas novas. E tédio é um indutor de estresse”, esclarece Carlos. Esse estresse, se for constante, afeta o bem-estar do pet e, com o tempo, até mesmo a sua saúde. Portanto, o estímulo à curiosidade felina é fundamental. E a melhor forma de incentivo são os estímulos externos que geram reações naturais involuntárias nos bichanos, as chamadas taxias. Algumas delas despertam comportamentos de caça, como pequenos animais voadores e objetos se movimentando cobertos por um tecido. Se você já teve o pé “atacado” pelo seu gato enquanto estava embaixo do cobertor, sabe o que é isso.

Waldir reforça que o incentivo deve ocorrer desde a infância, durante a aprendizagem inicial. “Os filhotes aprendem rapidamente ao observarem o gato adulto, em geral a mãe, realizando uma tarefa antes que eles tentem executar a mesma coisa”, diz. Para o veterinário, o contato do filhote com o adulto é bem importante. Mas outras brincadeiras ao longo da vida podem auxiliar também, como as que imitam os movimentos de possíveis presas dos gatos. O tutor pode movimentar diante do pet um barbante ou um fio com um objeto pequeno amarrado na ponta, fazer barulhos e utilizar brinquedos em locais fora da vista do gato, simulando uma presa escondida. “Nesse momento, a reação felina é: ele precisa descobrir o que está fazendo o barulho ou o movimento. Ele vai fazer de tudo para chegar até a ‘presa’, não consegue controlar”, exemplifica Carlos. 

Outras sugestões do especialista para os tutores são: organizar brincadeiras fazendo movimentos com apontadores laser, utilizar brinquedos que se mexem sozinhos e apostar em opções que liberam petiscos conforme o pet mexe com elas. “Uma coisa bacana para fazer é mudar o lugar onde o gato se alimenta de vez em quando. Variar o local, variar o tipo de comida com sachês e petiscos”, recomenda. É importante lembrar que o tutor deve fazer mudanças e revezamento nas brincadeiras conforme o gato se acostumar a elas. 

Alerta sobre intoxicação
A curiosidade felina deve ser incentivada, mas existem alguns limites que, se extrapolados, podem colocar a vida do pet em risco. Algumas plantas comuns, que podem ser alvos do interesse do gato, podem ser muito tóxicas se forem ingeridas, explica a veterinária clínica geral Gabrieli Fodra, de Santos, SP. São elas: antúrio, espada-de-são-jorge, bico-de-papagaio, dracena, aspargo-samambaia, filodendro, comigo-ninguém-pode e dama-da-noite. As flores tóxicas são: hortênsia, copo-de-leite, violeta, cyclamen, lírio, azaleia e tulipa. Existem alimentos que também causam intoxicação nos gatos, como cebola, alho, uva (natural ou seca), chocolate e alguns vegetais, como tomate verde e batata verde. “É importante lembrar que os felinos podem se intoxicar com outras plantas e produtos não citados aqui, pois cada organismo pode ter uma sensibilidade individual significativa”, alerta a veterinária. Ou seja, muito cuidado ao deixar que seu bichano tenha contato com plantas, produtos de limpeza e alimentos humanos. Se houver contato com alguma substância tóxica, é necessário procurar assistência veterinária imediatamente. “A intoxicação pode gerar efeitos graves no pet, que pode apresentar sintomas como apatia, perda de apetite, irritação de pele, vômito, diarreia, falta de coordenação motora e até convulsões”, conclui Gabrieli.


Agradecimentos:

Carlos C. Alberts
Professor e pesquisador do Laboratório  de Evolução e Etologia  (LEvEtho), da Universidade  Estadual Paulista (Unesp).

Gabrieli Fodra
Médica-veterinária clínica geral de pequenos animais na Stetic Dog’s, em  São Paulo. Graduada em Medicina  Veterinária pela Universidade  Metropolitana de Santos (Unimes).

Waldir Fonseca
Formado pela Faculdade Metropolitana Unida de São Paulo, atua na área de Patologia Clínica. Atualmente é Diretor Técnico Executivo no Pasteur Diagnóstico Veterinário.

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